sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

A vez do morro

favela escada

Considero extremamente louvável a troca dessa política de confronto que havia sido adotada pelo nosso governador em seus primeiros anos de mandato – o que resultou apenas no aumento dos índices de criminalidade e de mortos em confrontos policiais – por uma presença mais ostensiva da polícia em favelas, diminuindo o poder territorial dos traficantes. Mas admito que o claro comprometimento do governo do estado em pacificar apenas as comunidades da capital me assusta um pouco.

Por fatores diversos, os quais perderíamos horas aqui só para listá-los, Niterói tem sofrido com um acelerado processo de favelização, surgindo novas comunidades a cada dia e tornando completamente inchadas as já existentes. Sem a presença do Estado – frize-se que aqui em Niterói a prefeitura é completamente omissa nessas questões, enquanto o governo do estado só pensa na capital – essas comunidades tornam-se abrigo principalmente para bandidos oriundos de favelas pacificadas no Rio. Não só as comunidades de Niterói, mas também outros lugares que, segundo a lógica do governador, talvez tenham menor importânica ainda, visto que não tem sequer potencial turístico que justifique o investimento, tais como São Gonçalo, Baixada Fluminense etc.

Esse reflexo já é visto nas estatísticas e sentido pelo povo de Niterói. Por serem traficantes de outras áreas, buscam abrigo em favelas controladas pela mesma facção, mas não podem exercer seu antigo ofício, por assim dizer. Daí resulta que eles têm que buscar outros meios de subsistência – ilegais, é claro. Com isso, há um incremento na quantidade de assaltos, sequestros e afins.

A governadoria não pensa em outra coisa senão a Copa e os Jogos Olímpicos – faz bem em priorizá-los, eis que o Rio é a vitrine do Brasil, mas isso não deve se tornar um privilégio, uma exclusividade. E a prefeitura do município só pensa em… sei lá no que ela pensa. Talvez no interminável Caminho Niemeyer, como se a solução para os nossos problemas estivesse em meia dúzia de prédios assinados por Oscar Niemeyer – nada contra, muito pelo contrário, sou fã do cara, mas isso não me impede de ter uma visão clara e objetiva dos fatos.

Deve-se ainda observar que o processo de favelização constante por que passa Niterói tem consequências ainda mais nefastas. Até porque, como visto no Rio, a questão da segurança se resolve simplesmente com policiais na rua, cumprindo seu dever institucional, que é a proteção do cidadão, seja ele quem for, e não invadindo favelas uma vez por mês e atirando a ermo contra bandidos e ferindo a dignidade de quem mora ali e possui trabalho, família etc.

A verdade é que da favelização resulta uma degradação ao ambiente, além de risco à vida – com construções mal-feitas em áreas de riscos – e à saúde das pessoas, já que não há em muitos casos água encanada e esgotamento sanitário, somado ao fato de as casas serem em geral sobrepostas umas às outras, criando ambientes úmidos e insalubres, propícios para determinadas doenças.

Modificar esse panorama é uma questão de se atender ao princípio da dignidade da pessoa humana, princípio motriz de toda a Constituição, para o qual todas as normas devem ser conduzidas. Então não podemos fechar os olhos a essa nova situação pela qual Niterói passa e exigir do poder público, em todas as suas esferas, uma melhor atuação.

Ouvindo O morro não tem vez, de Tom Jobim.

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