terça-feira, 31 de março de 2009

Texturas

Pois bem, que procuras?

cadernos

No texto texturas,

tais como juras de um amor

livros

que não dura o tempo que for preciso pra se revelar?

sofá

Texturas no quarto

Na sala de estar

pregos e coca

Na coca-cola, em meio ao jantar

No cômodo incômodo, ao se arrepiar

comida

Na corrida, pra não se atrasar

Na vontade apenas de se bem amar.

A quase-poesia é na verdade apenas uma desculpa pra colocar umas fotos por aqui…

Quando um vendedor me abordou na rua

 

vendedor

Um certo dia, ao ser indagado por um vendedor, Sócrates disse: “Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz”. O mestre da retórica nos apresenta uma grande reflexão – que se torna bastante atual – sobre uma cultura do consumo onde somos levados por questões diversas, como estética, impulso, futilidades, entre outras coisas, esquecendo a parte funcional e principal que deveria justificar a existência daqueles bens que são oferecidos nas lojas. Mas prefiro me ater a outra face deste fato vivido pelo filósofo grego: no tempo de Sócrates já havia vendedor chato.

Vendedor, um dos grandes males da humanidade capitalista. Aquele ser que provavelmente ganha menos do que eu, estudou menos do que eu, trabalha que nem um condenando (muitos para enriquecer seus patrões) e tem a grande função de ludibriar-nos com suas técnicas obscuras. O comentário possui uma certa irritação nas críticas, pois diferentemente de Sócrates, às vezes não sei argumentar com um vendedor e me pego comprando inutilidades ou coisas que eu não queria no momento. Hoje foi mais um dia desses.

Já estive do outro lado e vi que realmente não poderia ser do ramo. Como vendedor de consultorias de cheque, gastei muita sola de sapato, ganhei vários “nãos” irritados e cheguei a correr de um dono de estabelecimento portando uma peixeira. Tudo isso porque não sabia muito bem sobre esta tal arte da persuasão, do convencimento. Mas o vendedor que me abordou hoje na rua sabia. E como sempre, fui mais um contabilizado no caderninho dos idiotas que caem nas historinhas melodramáticas.

O vendedor me aborda:

- Você gostaria de ganhar uma revista de graça?

- Pode ser -, respondo sem muita convicção.

- Então, esta é uma promoção da editora Globo que quer incentivar a leitura. Ela e os cartões de crédito estão oferecendo de graça assinaturas de algumas revistas (Observação: como eu poderia cair nessa história de Editora Globo e Cartões de Crédito dando algo de graça?)

- Que legal! – acompanhado de um sorriso “chocho”.

- Pois é. E se eu conseguir 100 assinaturas, eles ainda pagam uma mensalidade da minha faculdade (É, ele pegou pesado. Agora eu, nestes poucos minutos, deveria me preocupar com o futuro acadêmico do vendedor também)

- Pô, que legal!

- Você só terá que pagar a entrega, pois os Correios não estão fazendo parte da promoção (Ou seja, aquele de graça que o cara mandou no início da conversa foi pro beleléu).

E assim a situação foi continuando. No final, saí com uma dívida de 280 reais para pagar no meu cartão (Visa, obrigado pelo incentivo à leitura) e vou receber as edições de Marie Claire em casa, como eu sempre sonhei (tentei ser irônico agora, mas a irritação é tanta que caso alguém me imagine chorando de raiva por ser mais um idiota, fiquem a vontade).

Obs.: Parafraseando um episódio do inigualável programa de humor infantil Chaves do oito: “15 pessoas enganadas! 15 pessoas enganadas!”

sexta-feira, 27 de março de 2009

Que a falta me falte

SDC10678

Foto da foto por Renan

 

Começou a cair o outono.

Nas mãos o coração

No coração, a primavera

Escutou-se o som dos pássaros,

o piar em meio às folhas mortas.

No ouvido o coração

No coração, o som de outrora

Lembrou-se das manhãs das flores

e o cheiro que é mais denso

que qualquer outra lembrança.

Nos olhos o coração.

No coração, lágrimas de falta.

A falta que traz o luto

Quisera eu vencer a luta, mas não soube lutar.

A falta que traz a dor

Quisera eu ser amado, amor que não soube dar.

Essa falta que ultrapassa a saudade,

deixa um vazio e a ânsia de respirar,

subir à tona antes de sufocar

entre súplicas de que a falta me falte.

A poesia acima é uma contribuição de Julia.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Eu sou amigo virtual do Bruno de Luca

 

É engraçado quando muitas vezes eu me pego na tentativa de contextualizar qualquer teoria acadêmica com a simplicidade do nosso dia-a-dia. Trazer o pensamento científico para dentro de nossos lares, oferecer-lhe café e bolachas e convidar para assistir Ana Maria Braga é uma maneira de dizer que é familiarizado com o conhecimento avançado, provando para seus colegas de rua que a universidade não é apenas um local para festas, vagabundagem deliberada ou estudos aprofundados de jogos de cartas/azar.

Estudando sobre os novos processo de socialização, não podemos fechar os olhos para as tais novas mídias sociais. Qual de nossos leitores e contribuintes não possui MSN ou um perfil no Orkut? Acho que conto nos dedos de uma de minhas mãos. Entender este processo de interatividade, do uso de “comunidades” para a comunicação, para o entretenimento, para o estudo; assunto que permeia não só as universidades, mas mesas de bares, chats, entre outros. Acredito que até aquele que mal sabe falar a nossa língua – o miguxês está aí para uma melhor inclusão digital - tenha interesse em desvendar os mistérios deste novo sistema de comunicação.

Pois bem, nesta fome ensandecida pelo conhecimento e popularidade sócio-virtual, criei uma conta no novo Twitter. Sem saber, de fato, o que me esperava, fui na crista da onda e fiz todos os procedimentos para me aventurar no site. Para quem não sabe, o Twitter é uma espécie de micro-mensageiro que pode servir como torpedo. A pergunta proposta é esta: O que você está fazendo? Seria basicamente isso o que os usuários do Twitter querem saber.

Não vou me ater muito numa discussão que para este espaço se tornaria chata, mas sim, pensei em algumas teorias. Uma delas é do Panóptico, termo criado por Jeremy Bentham para explicar uma espécie de observação vigilante sem que a pessoa vigiada saiba se está sendo vigiada ou não (essa foi uma explicação bem superficial e até repetitiva; peço desculpas por isso). Ou seja, utilizando a teoria neste site, eu escrevo o que estou fazendo agora, você lê e não sabe ao certo o que fazer, se me manda para aquele lugar, se brinca de big brother...

Ligando o computador, vejo em minha caixa de e-mail a seguinte mensagem: Bruno de Luca has requested to follow you on Twitter! Bruno de Luca? Esse nome não me é estranho. Fui direto ao Twitter e descobri o que muitos se orgulhariam de ter recebido: um convite do ator Bruno de Luca. Não vejo Multishow, mas me lembro daquele ator gordinho que se divertia em “peripécias danadas” na novela Malhação. Pois é, agora eu sei o que o Bruno de Luca está fazendo neste momento. Não sei se eu o mando para aquele lugar, se brinco de Big Brother... Bem que eu poderia saber do Chico Buarque, da Luana Piovani, do presidente norteamericano Barack Obama, mas, por enquanto, o Bruno de Luca já está de bom tamanho.

                            twitter copy

P.S.: Relembrando Assim Caminha a Humanidade, do Lulu Santos

terça-feira, 24 de março de 2009

O vento vai dizer lento o que virá…

De fato, já se passou um fim de semana inteiro, e nem ao menos uma palavra. Mas de hoje não passa, com certeza hei de escrever aqui a respeito da experiência da última sexta-feira. É certo que até alguns dias antes nem pensava em estar lá, mas convencido por um grande amigo, agora recorrente companhia em situações como essa – já são dois; valeu Zé! – decidi ir.

A odisséia começa ainda no ônibus. Ou melhor, começa antes dele. Isso porque, tendo marcado de chegar lá por volta das cinco e meia da tarde, cautelosamente dirigi-me ao ponto de ônibus por volta de quatro horas, para ter certeza de que não teria atraso – afinal, era melhor esperar do que perder o que estava por vir. Mas tamanha precaução não foi suficiente, uma vez que não consegui antever o fato de que, como disse acima, por se tratar de uma sexta-feira, o trânsito podia não ser dos mais favoráveis. Por conta disso, esperei um bom tempo, até que um primeiro coletivo aparecesse por lá, só pra avisar ao despachante que a porta estava quebrada, e que ia voltar pra garagem – sendo que tinha acabado de sair de lá!

No fim das contas passei 40 minutos em pé esperando pelo maldito ônibus. E quando este por fim chegou, não necessariamente representou um alívio, pois que ainda fui obrigado a passar um bom tempo no engarrafamento. O trânsito até que fluía bem, mas foi chegar ao vão central da ponte, exatamente no alto, onde ele para de subir pra começar a descer que eu tive a visão exata: tudo engarrafado, completamente parado. Mas não esmoreci, até porque o que poderia fazer? Puxar a cordinha e descer ali mesmo? Então esperei.

Mas quando enfim cheguei lá, por volta das seis horas, descobri que até que essa espera toda não tinha sido de todo ruim. Afinal o portão tinha sido aberto há pouco tempo, então, havia pouca gente, porém muita expectativa. A espera de uma hora que ainda restava até o começo – afinal a pontualidade britânica determinava que os trabalhos deveriam começar às sete em ponto – só fazia aumentar essa expectativa. E mais pessoas iam chegando, e com isso, aquele cenário tão habituado a desfiles carnavalescos ia ganhando outros contornos – igualmente carnavalescos, é verdade, mas já em clima de quarta-feira de cinzas, até porque, bem sabemos, todo carnaval tem seu fim mesmo…

E por fim, a espera foi devidamente recompensada, quando aqueles quatro caras subiram ao palco para dar início àquela catarse coletiva. E foi reiterando que o carnaval já está findo – esta talvez fosse apenas uma festa fora de época – que eles deram início a mais um show sensacional.

Ainda acreditando que carnaval tem sempre, o que mais eu poderia ouvir – e ver – por aqui?

Como não consegui uma versão ao vivo, vai o clipe mesmo...

quinta-feira, 19 de março de 2009

Alguma coisa está fora da ordem…

pombo estátuaO mundo está ao contrário e ninguém reparou… 

O julgamento esta semana do “monstro de Amstetten”, como ficou conhecido Joseph Fritzl, sueco que manteve presos em cativeiro sua filha Elizabeth por 24 anos, e seus três mezzo netos, mezzo filhos por todo o período de existência dos mesmos, trouxe esse assunto de volta depois de um tempo sem quaisquer notícias relacionadas.

Vejo hoje que ele já foi condenado à prisão perpétua, pelo crime de homícidio culposo de um dos seus sete “filhos-netos”, que nasceu com problemas de saúde, mas não teve o devido socorro de sua parte, que era o único que naquela situação poderia fazer algo, além dos crimes de estupro, incesto, coação e sequestro, e terá que cumprir sua pena em instituição psiquiátrica.

Para quem não esteve no planeta nos últimos meses, trata-se, pois, de uma das histórias de sequestro, cativeiro e afins mais chocantes de que se tem notícia, se não a mais – não sei afirmar com certeza, pois não sou especialista em sequestros famosos na história, mas acho que deve ser. Digo isso porque o cara construiu um bunker que o protegeria até de invasões alienígenas, se fosse o caso. Mas não era: com o pretexto de que contruía um escritório para uso particular ou coisa parecida, ele fez uma casa embaixo da casa onde morava – com os pais e a esposa! Tudo isso sem que ninguém suspeitasse.

A frieza com a qual esse homem conduziu toda essa situação, somado ao modo como as demais pessoas diretamente envolvidas se conformavam com todos esses acontecimentos, é algo extremamente difícil de se entender, principalmente para aqueles que como nós temos essa herança latina nas veias. Como a esposa desse homem, mãe da Elizabeth, nunca suspeitou de nada? Quando ela foi sequestrada, o pai simplesmente lhe disse que a filha havia indo embora com uma seita, como faziam os hippies na década de 70, ou como se ela tivesse se tornado uma amish – se vivesse nos EUA seria até possível –, ou coisa parecida. Ele inclusive, chegou a registrar o desaparecimento da filha na polícia.

Além disso, tem-se ainda o fato de que três dos sete filhos os quais Elizabeth deu à luz enquanto esteve no cativeiro foram criados na superfície, tendo sido deixados na porta da casa de Joseph, junto a cartas forjadas, na qual a filha alegava não poder criá-los onde se encontrava. Ninguém teve nenhuma suspeita, por mínima que fosse? Três crianças deixadas na porta? Nenhum assistente social suspeitou de nada?

Como disse acima, talvez para sociedades como a nossa, tão acostumadas ao calor de um abraço, e não à frieza de um aperto de mão, situações como essa sejam um tanto quanto incompreensíveis. Por mais perfeitos que tenham sido os atos praticados pelo Joseph Fritzl, se fosse em uma situação análoga aqui no Brasil, já haveria suspeita por todos os lados. As pessoas perguntariam, a esposa buscaria alguma notícia, além de querer saber por que cargas d’água o marido passava tanto tempo nesse porão que ela sequer conhecia.

Para muitos, esse espírito latino, essa coisa de tocar, abraçar, querer saber dos outros, tão presente em nossa sociedade é visto como um atraso; os países mais desenvolvidos só são assim porque há uma prevalência do indivíduo sobre o social, isso em todas as esferas. São, em geral, mais frios em suas relações, onde o que o que impera é a impessoalidade, de modo que, quando situações como essa vêm à tona, há um choque geral e todos ficam pensando em o que poderiam ter feito para evitar tais tragédias. É o mesmo que ocorre nesses massacres estudantis, que a gente já se acostumou a ver com certa frequência nos noticiários – outro dia mesmo houve um destes. O modus operandi desses jovens é sempre o mesmo – sair atirando a esmo, tal qual nos filmes de ação ou nos clipes das bandas que cultuam  –, assim como o padrão comportamental se repete: normalmente os nerds da turma, que foram zoados a vida inteira, de poucos amigos e de muitos ressentimentos – talvez só precisassem de uma terapia, ou de alguém mesmo pra conversar. Mas na pressa desse mundo individualista, seus pais não tinham tempo pra perceber isso, assim como não havia amigos que os pudessem escutá-los. Não estou eximindo essas pessoas de culpa, mas apenas afirmando que elas são produtos dessa sociedade fria e impessoal que nós estamos nos acostumando a entender como padrão. Assim como o Fritzl só pode fazer o que fez porque teve a complacência e a distância do seu meio social.

Dá ainda para traçar aí um paralelo até mesmo com a questão do Sean Goldman, garoto que teve a guarda requerida pelo pai biológico, David Goldman, na justiça brasileira, após a morte da mãe, brasileira, que o trouxe consigo para o Brasil já há cinco anos. Agora que a criança ficou sem a mãe, o pai transformou a luta pela guarda em um verdadeiro circo, criando inclusive um site onde vende produtos com o rosto da criança para angariar fundos para custear o processo judicial (www.bringseanhome.org) e aparecendo em programas de TV como o da Oprah, ou sei lá o quê.

Ele se apoia no fato de que, pela lei norteamericana, o garoto deveria estar com o pai biológico. Mas em cinco anos, o mesmo não fez qualquer esforço no sentido de aproximação do menino. Agora, que ele já tem muitas de suas bases afetivas estabelecidas, o pai pretende simplesmente extirpá-lo do meio onde vive. Não é questão de se dizer que está certo ou errado, afinal ele é pai – e os direitos decorrentes da paternidade não prescrevem –, mas de se procurar saber se a letra fria da lei de fato aplica-se incondicionalmente a tal caso.

Sei que dei uma viagem imensa aqui, abordando assuntos aparentemente tão diversos, mas que no fundo têm uma mesma origem. Não se trata aqui de pensar, como num regresso ao infinito, que essas pessoas citadas acima não têm culpa no que fizeram, ou que o pai tem ou não direito à guarda do filho, e afirmar que na verdade é tudo culpa da sociedade. Trata-se, sim, de admitir que, como no título, e na canção, alguma coisa está fora da ordem, e que nós latinos, tão afetos à pessoalidade e abraçadores de gente, não estamos tão na contramão assim.

Esses assuntos ficaram na minha cabeça essa semana, e esse link que eu fiz entre todos eles só foi possível graças a um grande amigo, e ao que ele me disse essa semana. Foi aí que me liguei que a essas pessoas só faltava um abraço, e poder dizer, despretensiosamente “amo-te” uns aos outros ou coisa parecida.

terça-feira, 17 de março de 2009

lá lá lá… Hey Jude!

 

Passei a semana que passou inteira assistindo a um filme, que de cara já entrou pra lista dos meus filmes favoritos. Trata-se de “Across the Universe”, que seria apenas mais um romance água-com-açúcar, se não fosse o fato de ser um musical; não um musical qualquer, mas apenas com canções dos Beatles. Por conta disso, passei uma semana só ouvindo o Fab Four – tá bom, admito que ouvi um sambinha aqui, um “Los Hermanos” ali, mas o quarteto de Liverpool dominou o set list da semana. Isso me remeteu a uma parte significativa da minha infância, na qual, não sei por que razão exatamente, eu tinha a música Hey Jude, dos Beatles, entre as minhas músicas favoritas. Acho que devia ter essa música em algum disco dos meus pais aqui em casa – é isso mesmo que você leu: disco!, de vinil.

A verdade é que eu, em meus áureos tempos de infância, quando sequer sabia quem eram os Beatles, quanto mais que já tinham se separado, e que o vocalista, inclusive, já tinha morrido – imagina minha decepção quando descobri isso tudo –, já sabia de cor a música. Por saber de cor subentende-se que me refiro àquela linguagem comumente conhecida como embromation. Sabia apenas o “Hey Jude!”, que dá nome à canção, e o “lá lá lá lá”, que toma quase quatro minutos da música em sua versão original, que tem sete ao todo. Logo se vê que para uma criança, portanto, cantar essa música não era das tarefas mais difíceis. Mas naquela época, para mim, todas as músicas em inglês eram facilmente cantáveis; não tinha dificuldade nenhuma em cantá-las, mesmo não tendo a menor ideia do que estava pronunciando. Imaginava diversas histórias praquelas músicas. Inclusive nesta eu imaginava que Jude era uma mulher, até que, depois que aprendi inglês, entendi que se tratava, na verdade, de um homem.

E com isso, a música se torna uma das coisas mais democráticas que se pode haver para uma criança, pois que não é preciso nem mesmo saber a letra. E se ainda assim não souber cantar através do embromation, sempre há espaço pra se ficar apenas no “lá lá lá”. E olha que essa música em particular é excelente pra se fazer isso. Quando crianças temos dessas coisas – e quando não sabemos inglês também –, e no fim das contas, é muito melhor do que ficarmos tentando entender racionalmente essas letras de hoje, e nos decepcionarmos com a pobreza das mesmas. Às vezes a imaginação infantil consegue ser mais fértil do que a dos compositores atuais.

Certa vez li, em alguma entrevista, que algum artista – acho que foi Caetano Veloso – disse que costumava escutar canções em inglês com ouvidos de criança. Não costumava prestar muita atenção nas letras, mesmo ele sabendo inglês – até mesmo porque ele viveu um bom tempo em Londres, no exílio. Nesse momento me identifiquei muito com o que ele havia dito, mas ao mesmo tempo percebi que já fazia um tempo tinha deixado esse costume pra trás. Tinha me acomodado naquela racionalidade descrita acima, e, como aprendi inglês já tem um tempo, acho que perdi essa forma pueril de se ouvir as coisas. Mas ver esse filme essa semana – acredite, o vi muitas vezes – fez-me lembrar como é bom frear às vezes, e só ouvir com ouvidos de criança.

Ouvindo, e vendo, como não poderia deixar de ser, Hey Jude, dos Beatles, na versão do filme. Veja um pouquinho aí também, e quando chegar no “lá lá lá”, mesmo que não saiba a letra, não tenha vergonha e cante junto…

sexta-feira, 13 de março de 2009

O caminho do mar…

 

pescadores

na hora que as pessoas levantam pra ir trabalhar, eis que ele volta de lá, cansado, mas realizado. novamente, fez seu trabalho, trouxe seu sustento, a comida do rebento e a satisfação de fazer bem feito aquilo que Deus lhe permitiu fazer.

prende o barco, guarda as redes, carrega os peixes. limpa, grita, vende. e assim segue a manhã inteira, até chegar em casa e ver a mulher, rendeira, trabalhando pra ajudar no sustento, prover à família um melhor contento. conserta as redes, tece rendas de sonhos, numa espera enorme.

espera o marido retornar do mar, espera o filho, que acabou de nascer, tornar-se de uma grandeza tal que espante tudo que há de mal, e os carregue dali. leve-os para um lugar onde não haverão de se preocupar com as agruras de se depender daquilo que lhes manda o mar. rezam para que sua mãe que está nos céus, e que os guia em todas as suas jornadas, permita-os um dia não precisar mais pescar.

só que o que fará o pescador quando esse dia chegar? nasceu para isso, outro ofício não aprendeu jamais; conhece apenas daquilo que o mar lhe traz. sentir-se-á sozinho, sem propósito a realizar neste mundo. eis que quando este dia chegar, quando seu filho o resgatar e não mais tiver que pescar, o pescador, ao encarar as águas, seja em qualquer lugar, haverá de se levantar, pegar suas redes e lançá-las à infinitude do mar.

"Sempre pensar em ir

caminho do mar.

Para os bichos e rios

Nascer já é caminhar.

Eu não sei o que os rios

têm de homem do mar

Sei que se sente o mesmo

e exigente chamar.”

João Cabral de Mello Neto.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Eles se amaram e mais nada


Foi assim que tudo começou. O amor entre os dois não era previsto. De um lado, a família dos Silva, conhecida principalmente pela grande fazenda de cacau no sul da Bahia. Do outro, a família dos Correia, humilde, simples, porém de grandes trabalhadores.


A sorte é que a família dos Correia não precisava se preocupar com o dote. Dar a única alegria feminina para uma noite de amor com um dos Silva trazia certos pensamentos de tristeza e desolação; apesar da falta de dinheiro, ela sempre foi cuidada com amor e respeito. A família dos Correia sempre prezou pela honra, pelo orgulho. Até na vizinhança as pessoas criticavam a maneira como tratavam sua pequena, uma vez que o restante da família passava por problemas financeiros. Mas sempre que alguém colocava a opinião abertamente, Dona Chica não pestanejava: além de ela ser nossa única alegria, é um investimento que fazemos.


Já os Silva sempre foram abastados, nunca se preocuparam com falta de dinheiro. O macho da história era tratado como um lorde. Não lhe faltava nada. Na fazenda, onde a família passava a maior parte da semana, os empregados eram pagos para dar o melhor serviço que ele merecia.


Num final de semana, a empregada mais nova ficou encarregada de cuidar do varão. Toda a família teria viajado para Recife, numa visita rápida aos parentes distantes. Em uma rápida ligação, a empregada e Dona Chica trataram do encontro entre os dois.


Naquela noite, Lorde e Princesa se conheceram e se amaram. Nada regado a contos de fadas - eles se amaram e mais nada.


Sete meses depois, o resultado da cria revelava o número que traria a guerra entre as famílias. De um lado os Montéquios e do outro os Capuletos. Madame Cláudia, a matriarca Silva, ficara sabendo dois meses depois do acontecido e queria a sua parte na história. A empregada, que organizou o encontro como uma espécie de procuradora, já tinha o seu valor acordado. Dona Chica, mulher trabalhadora e de honra, queria o que lhe era merecido. E Princesa deu a luz a sete lindos pastores de Shetland.

Sete é um número interessante: sete dias da criação do Mundo, sete arcanjos do trono de Deus, sete cores do arco-íris, sete notas musicais, os sete pecados capitais... Mas naquele momento, o sete trazia a desgraça. Um cachorro ficaria com a empregada, e os demais seriam divididos igualmente. Igualmente? - ponderou Dona Chica, que não gostou da decisão. Sua princesa era quem mais sofrera com a gravidez e com o parto. Foram os Correia que gastaram a maior parte, pagando alimentação e moradia para a cadela. E por que ficaria com o mesmo número dos Silva?


- Eu sou a única das redondezas que tenho um Pastor de Shetland, assim como você. Se não fosse meu macho, você não teria esses filhotes. E eu não quero vender. Você não teria pena desses cachorrinhos? -, disse Madame Cláudia.


- Isso não te interessa! Quero ficar com a maior parte, pois preciso do dinheiro. Consigo vendê-los pelo melhor preço do mercado e você não vai tirar isso de mim.


E assim a discussão entre as duas famílias durou quase uma eternidade. Para Lorde e Princesa, nada interessava, pois eles se amaram naquele final de semana e mais nada.

sexta-feira, 6 de março de 2009

O homem que tinha dois corações

dois corações

Não se sabe por que razão exatamente. Mas a verdade é que, ao contrário deste que se pode ver nos jornais essa semana, este a que me refiro já nasceu assim. A mãe lembra ainda da primeira ultrassonografia, na qual todos pensavam tratar-se de gêmeos. Os pais fitavam o monitor na esperança de encontrar ali naquela massa cinza que a tela indicava qualquer sinal das duas crianças, mas só encontravam uma. Diziam que se tratava da má qualidade do equipamento – afinal, não dispunham de muitas posses, e mesmo assim, àquela época, os equipamentos não eram tão desenvolvidos quanto os de hoje em dia. Mas poucos meses depois os médicos não viam qualquer desenvolvimento de outra criança além dele; e o seu nascimento então desfez qualquer dúvida quanto a outro bebê ou não. Era apenas um, mas com dois corações.

De fato, por alguma anomalia sem explicação aparente – daquelas que só se vê na TV, em House –, ele nasceu com dois corações. Ainda criança, os médicos diziam que talvez não vivesse muito. Afinal, por algum motivo que não sei explicar direito, ter dois corações não é exatamente algo normal, fisiologicamente falando. Mas, contrariando o que apontavam todas as previsões médicas, ele viveu, e muito. Acho até que esses dois corações deram um certo impulso, rejuvenescendo-o ao longo dos anos – não, ele não é o Benjamin Button, mas é como se os corações se revezassem ao longo do tempo nessa função de bombear sangue, de modo que nunca se cansavam completamente.

Deste modo, ele sempre estava bem disposto; foi sempre uma criança saudável, e se desenvolveu sem problemas. Em sua vida adulta, não era exatamente um atleta, mas não se privava de umas corridas no calçadão às vezes, ou um futebol com os amigos no fim de semana.

E assim seguia a vida, batendo de frente com todos os prognósticos que lhe diziam que não vingaria. Nunca se viu coração que fosse tão saudável quanto os seus, e ele jamais se privou de atividade alguma em nome da suposta doença. Pelo contrário, fez tudo o que pode: enquanto criança, estava sempre de castigo, seja em casa, seja no colégio, por conta do que aprontava; quando adolescente, brigou com os pais, saiu de casa, teve várias namoradas etc etc; já adulto, passou a fazer da bebida e cigarros um hábito – como tinha dois corações, pensava, deve ter maior resistência a esses males –, além de relacionamentos fugazes com mulheres que não fazia questão alguma de conhecer melhor.

Sempre se gabava de seus dois corações – diziam que o tornavam uma pessoa melhor –, como se isso o tornasse superior às demais pessoas. E com isso passou uma vida inteira alheio a elas, sem se envolver demais com ninguém: amigos, namoradas, família – como se ele se bastasse.

- Ele deve achar que tem o rei na barriga! – pensavam muitas de suas “ex” ao serem dispensadas, ou seus poucos amigos, ao serem desprezados, ou ainda, seus poucos familiares que mantinham contato, entre outros; era, de certo modo, pensamento corrente de quem se envolvia com ele.

Consultando o dicionário, vê-se que a definição de “coração”, além de órgão responsável pela circulação do sangue, é também sede da sensibilidade moral, das paixões e sentimentos, o conjunto das faculdades afetivas. Nesse quesito, porém, nosso amigo deixava a desejar. Já no fim da vida, ao olhar pra trás e observar o que fora feito até então, o que ganhou e o que perdeu, ele percebeu que ter dois corações nunca foi uma virtude, pois que nesse sentido ele era exatamente o revés do que coração pode significar. Ao fim de sua vida descobriu, portanto, que apesar de sempre ter tido dois corações, nunca soubera como usá-los.

terça-feira, 3 de março de 2009

Papai tirou Marcelinho Carioca do Flamengo



Naquela tarde de 13 de julho de 93, havia um céu ensolarado digno de verão. Eu cursava a primeira série, logo, não me recordo a circunstância que levou o Fla-Flu do Torneio Rio-São Paulo daquele ano para o estádio Caio Martins, em Niterói. Saí da escola no meio do recreio e fui rapidamente para casa e lá encontrei meu pai. Vesti minha blusa do Mengão e rumamos ao Caio Martins lotado.

O tumulto era grande, comprar ingresso era inviável. Assim sendo, meu pai se juntou à massa rubro-negra que estava a socar um dos portões restritos à imprensa e, de forma milagrosa, um policial o avistou e abriu uma fresta do portão. Era impossível não notar sua presença no meio de tantos torcedores com vestimentas propícias a uma partida de futebol, logo, o policial abriu uma parte do portão, permitindo somente a minha entrada juntamente com meu pai.

Não demorou muito para meu progenitor desenvolver uma de suas falácias:

- Sou da Rede Bandeirantes. – disse ele.
- Posso ver suas credenciais, senhor? – indagou o PM.

Ao ver a possibilidade de não assistir o jogo crescer após a pergunta, papai nem pensou duas vezes ao responder: “Ah, estou atrasado, oras!”.

E assim prosseguimos em direção ao acesso da tribuna de honra do estádio, já que meu pai trabalhava, supostamente, numa emissora de tevê. Não lembro o motivo que nos fazia sempre a assistir os jogos de dentro da tribuna de honra sem pagar nada a mais por isso.

Estádio lotado, o jogo começa, Flamengo parte pra cima. Não demorou muito para, ainda no primeiro tempo, Renato Gaúcho – ainda ídolo do Fla – abrir 2 a 0 para os flamenguistas. O tricolor carioca parecia desnorteado com a superioridade rival. Lembro-me de um atleta do Flu meter a mão na bola de maneira incompreensível e levar cartão amarelo.

O Fluminense regressa para a segunda etapa com gana completamente diferente do tempo anterior, conseguindo diminuir, empatar e, aos 42 minutos do segundo tempo, virar a partida com um chute fortíssimo de Julio César, que bateu no travessão antes de entrar. Pane vermelha e preta: Djalminha e Renato Gaúcho – esperanças de gols do Fla – promovem uma briga dentro de campo que culminou no desligamento do filho de Djalma Santos junto ao Flamengo. Outro jovem e bom jogador que estava aquém do que se espera dele na partida era Marcelinho.

Marcelinho tinha 22 anos e já era um craque, cobrava falta com rara perfeição. Contudo, naquela tarde niteroiense, rendeu pouco, acarretando a indignação de meu pai que começou a xingá-lo incessantemente, solicitando sua substituição. Um cidadão de idade considerada começou a defender a permanência do atleta em campo, iniciando um prolongado bate-boca ríspido com meu pai que duraria até o final do jogo.

Jogo encerrado, meu pai se despede do seu desafeto momentâneo e é perdoado pelas ofensas proferidas. O Flamengo regressaria a Niterói em setembro do mesmo ano, após uma excursão pela Europa, para duelar com o Bragantino. Na tribuna, lá estavam, novamente, eu, Rui e o indivíduo que discutiu com meu pai no mencionado Fla-Flu. Como as pazes já haviam sido seladas, sentaram-se próximos um ao outro e bateram papo durante a partida inteira. E, em uma das minhas espiadas no bate-papo, meu pai me apresentou ao pai do Marcelinho. E assim percebi que, naquele dia, ele estava apenas protegendo seu guri.

Voltei a prestar atenção na partida que terminou em 1 a 1. Dessa vez, as vaias para o Marcelinho ganhariam mais adeptos além de meu pai que, por sua vez, vaiou contidamente, em respeito ao seu novo amigo. Esta seria a última vez que o atleta disputaria uma partida em Niterói vestindo a camisa do Flamengo. Já que, no final de 93, as vaias - originadas por meu pai - estavam tão notórias que foram temas de mesas redondas em programas de TV da época e, conseqüentemente, afetou a direção do clube que, por sua vez, vendeu o atleta para o Corinthians.Marcelinho chegou a São Paulo, ganhou status de ídolo dos corinthianos. Tudo por culpa do meu pai.
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Mais uma contribuição de um dos amigos do Ponto e Vírgula. Diogo Pretto, louro e de olhos azuis, flamenguista e fanfamídia.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Ponto e Vírgula Tottal!!!

Amigos do blog e do Zé, só para constar, o blog Ponto e Vírgula começa a ficar famoso. Além de um profile no orkut (Veja Aqui, e adicione!!!), o blog já virou notícia. O site Tottal marketing divulgou esta nota sobre o blog. Confira aqui!

Agora o céu é o limite... pelo menos até o próximo ponto e vírgula na frase.