quinta-feira, 12 de março de 2009

Eles se amaram e mais nada


Foi assim que tudo começou. O amor entre os dois não era previsto. De um lado, a família dos Silva, conhecida principalmente pela grande fazenda de cacau no sul da Bahia. Do outro, a família dos Correia, humilde, simples, porém de grandes trabalhadores.


A sorte é que a família dos Correia não precisava se preocupar com o dote. Dar a única alegria feminina para uma noite de amor com um dos Silva trazia certos pensamentos de tristeza e desolação; apesar da falta de dinheiro, ela sempre foi cuidada com amor e respeito. A família dos Correia sempre prezou pela honra, pelo orgulho. Até na vizinhança as pessoas criticavam a maneira como tratavam sua pequena, uma vez que o restante da família passava por problemas financeiros. Mas sempre que alguém colocava a opinião abertamente, Dona Chica não pestanejava: além de ela ser nossa única alegria, é um investimento que fazemos.


Já os Silva sempre foram abastados, nunca se preocuparam com falta de dinheiro. O macho da história era tratado como um lorde. Não lhe faltava nada. Na fazenda, onde a família passava a maior parte da semana, os empregados eram pagos para dar o melhor serviço que ele merecia.


Num final de semana, a empregada mais nova ficou encarregada de cuidar do varão. Toda a família teria viajado para Recife, numa visita rápida aos parentes distantes. Em uma rápida ligação, a empregada e Dona Chica trataram do encontro entre os dois.


Naquela noite, Lorde e Princesa se conheceram e se amaram. Nada regado a contos de fadas - eles se amaram e mais nada.


Sete meses depois, o resultado da cria revelava o número que traria a guerra entre as famílias. De um lado os Montéquios e do outro os Capuletos. Madame Cláudia, a matriarca Silva, ficara sabendo dois meses depois do acontecido e queria a sua parte na história. A empregada, que organizou o encontro como uma espécie de procuradora, já tinha o seu valor acordado. Dona Chica, mulher trabalhadora e de honra, queria o que lhe era merecido. E Princesa deu a luz a sete lindos pastores de Shetland.

Sete é um número interessante: sete dias da criação do Mundo, sete arcanjos do trono de Deus, sete cores do arco-íris, sete notas musicais, os sete pecados capitais... Mas naquele momento, o sete trazia a desgraça. Um cachorro ficaria com a empregada, e os demais seriam divididos igualmente. Igualmente? - ponderou Dona Chica, que não gostou da decisão. Sua princesa era quem mais sofrera com a gravidez e com o parto. Foram os Correia que gastaram a maior parte, pagando alimentação e moradia para a cadela. E por que ficaria com o mesmo número dos Silva?


- Eu sou a única das redondezas que tenho um Pastor de Shetland, assim como você. Se não fosse meu macho, você não teria esses filhotes. E eu não quero vender. Você não teria pena desses cachorrinhos? -, disse Madame Cláudia.


- Isso não te interessa! Quero ficar com a maior parte, pois preciso do dinheiro. Consigo vendê-los pelo melhor preço do mercado e você não vai tirar isso de mim.


E assim a discussão entre as duas famílias durou quase uma eternidade. Para Lorde e Princesa, nada interessava, pois eles se amaram naquele final de semana e mais nada.

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