sexta-feira, 24 de abril de 2009

Populismo Judicial

stfTomou o noticiário a recente briga envolvendo dois ministros do Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte do país: Joaquim Barbosa e o presidente da casa Gilmar Mendes. O bate-boca teve origem durante uma sessão do STF que julgava recurso de embargos de declaração interpostos pelo governo do Paraná contra decisão  de 2006 do próprio Tribunal Superior que declarou inconstitucional uma lei daquele estado, que cuidava do sistema previdenciário, e que segundo a qual os funcionários de cartórios privados estariam incluídos nesses sistema.

Depois passaram a tratar de uma lei de 2002, também declarada inconstitucional pelo STF, e que cuidava do foro pivilegiado a ex-autoridades. Determinados cargos políticos têm o que se chama de foro por prerrogativa de função, erroneamente chamado pela imprensa de foro privilegiado. Isso porque o foro dito privilegiado (no caso, o foro é um tribunal, e não a justiça de primeiro grau. Em algumas situações esse foro pode ser o próprio STF) se dá por conta da função que a pessoa exerce – por isso, por prerrogativa de função.

A ideia da lei (10.628/2002), de forma bem didática, era manter o foro por prerrogativa de função a todos que de alguma forma já tinham exercido cargo ou função que possui essa característica, pelo menos até que o processo instaurado chegasse ao fim.

Em ambos os casos os ministros divergiram a respeito de uma possível retroatividade das decisões que declararam inconstitucionais as referidas leis: já sabemos que a lei é inconstitucional, a discussão está em saber desde quando. Para o ministro Joaquim Barbosa, a primeira deveria ser ida como inconstitucional desde o início, em 1999, enquanto a segunda deveria ser pensado com muita cautela a respeito de uma retroatividade sem qualquer restrição, pois com isso, muitos processos envolvendo ex-políticos que hoje estão no STF, ou em outros tribunais superiores, deveriam ser submetidos aos juizes de 1ª instância, alongando-os ainda mais; muitos deles teriam que recomeçar do zero. Até faz um certo sentido, uma vez que as decisões do STF são, antes de tudo, políticas. Ainda mais nessas questões que envolvem leis inconstitucionais; há de se atentar ao fato de que a simples retirada da lei pode ter consequências nefastas a uma grande parcela da sociedade.

Foi aí que armou-se o ringue e começou o bate-boca entre as excelências, com ofensas de caráter mais pessoal do que qualquer outra coisa (aquela hora em que o min. Joaquim Barbosa fala nos capangas do min. Gilmar Mendes foi demais), e os ministros expuseram seus sentimentos ao vivo para toda a nação – através da TV Justiça, que possui uma enorme audiência, é claro – onde só não valia xingar a mãe e puxar o cabelo – isso era mais por conta da impossibilidade capilar de ambos.

O Gilmar Mendes realmente já tomou algumas decisões de cunho jurídico muito duvidoso – basta lembrar o caso Daniel Dantas e os seguidos habeas corpus no plantão judiciário, ou ainda aquela questão das algemas –, além dessa mania que ele tem de sempre expor seus pensamentos antes de sequer ver o processo e analisá-lo. Isso não é muito legal, ainda mais para um presidente do STF. Tem ainda o pensamento corrente de que, no poder – afinal ele é o presidente do STF –, o Gilmar Mendes tenha ficado um pouco soberbo. Sabe aquela frase de parachoque de caminhão, que diz “não sou dono do mundo, mas sou filho do dono”? Pois é.

Talvez, tomado por essas questões, o Barbosa tenha se enervado e dito tudo aquilo (o Gilmar Mendes estaria destruindo a credibilidade da Justiça e tal). Mas o STF, nesse sentido peca pelo excesso de transparência – ou pelo menos, pelo excesso em tentar ser transparente. Isso porque talvez deva ser a única Corte Suprema, em todo o mundo, que televisiona suas sessões, transmitindo-as ao vivo. Por mais que ninguém perca muito seu tempo vendo TV Justiça – bem, eu até perco – a verdade é que isso é suficiente para que no segundo seguinte a discussão já esteja no youtube, nos sites de notícia e na TV.

O Barbosa já havia se notabilizado por ter sido o primeiro cidadão brasileiro negro a se tornar ministro do Supremo, e também pelo julgamento do mensalão, em que era o relator. Com isso, o povo pode, mesmo que apenas um pouquinho, identificar-se com a Suprema Corte. E agora, retorna, simplesmente por ter dito algumas coisas que muitos dos queriam ter dito, mas não tiveram a oportunidade. Afinal, não é todo mundo que pode dizer isso ao filho do dono.

Não sei ao certo quem tem a razão nessa contenda, afinal, não parei pra ver o caso com detalhes, mas, independente disso, alinho-me, a priori, com o Barbosa. Não se trata de populismo político, como teria dito o Gilmar Mendes, mas apenas de responsabilidade com suas decisões. Mesmo que fosse voto vencido, Barbosa deixou seu recado.

Tinha cá pra mim que não ia me ater a assuntos jurídicos nesse blog, mas não dá pra fugir. De vez em quando não faz mal a ninguém…

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