quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Como conheci o Mumu da Mangueira...

Mumu da mangueira em seus áureos tempos televisivos

Tinha por volta de oito anos, não muito mais que isso. Até porque, não lembro exatamente o ano, mas tenho quase certeza que se deu por volta de 1993. O avião era da finada VASP, com certeza, como se vê do cartão lá embaixo – ou seja, tem tempo que isso se deu. A revista de bordo do avião trazia uma matéria sobre o Tipo, aquele automóvel da Fiat, que era o lançamento do ano; entre as comidas servidas durante o voo – que naquele tempo era uma fartura –, lembro-me que havia um chocolatinho de menta, no formato de uma hóstia, que era uma delícia, ao menos para meu pueril paladar. De fato, guardo com clareza de detalhes na minha memória tudo que ocorreu dentro daquele avião, disso estou seguro. Ou não...


Isso porque, naquela época, eu parava o que fosse que estivesse fazendo pra ver “Os Trapalhões”. Lembro que passava aos domingos, por volta de sete ou oito horas da noite, que vinha a ser justamente o horário da missa que meus pais de vez em quando costumavam frequentar. Pra mim isso era um verdadeiro martírio; que Deus me perdoe, hehehe, mas abdicar de Didi, Dedé, Mussum e Zacarias para participar, por uma hora – exatamente a hora do programa – da missa não era pra mim. Enquanto eu dormia no banco da igreja – convenhamos, criança alguma entende uma missa –, sonhava com o que se podia estar passando no episódio do “Trapa Hotel” daquele domingo, ou qual a história do “cafundó do brejo” que o Didi contaria dessa vez.


Então, pra alguém que gostava tanto assim dos Trapalhões, a situação pela qual eu passava era extremamente extasiante. Não entendi direito no começo o motivo da agitação das demais crianças que estavam no avião. Era um tal de olhar pra trás e cochichar, falar com os pais, apontar, mas ninguém ousava se mexer na poltrona.


Daí decidi olhar pra trás para ver do que se tratava, qual o motivo de tanta aflição naquele avião. Quando olho para trás, admito que a princípio não o reconheci: estava sentado na última poltrona do avião, com um semblante sério, uma roupa igualmente séria, que em nada lembrava suas vestes mais habituais, óculos de grau, e um livro, que não faço idéia de qual fosse, e nem me importava saber. Mas o que sei é que aquela visão em nada me lembrava aquele que pra mim era o melhor dos quatro trapalhões (espero que meu amigo Praião não leia esse post): Mussum.


Tá bom, tá bom. Admito que uma declaração como essa possa talvez chocar muita gente, e pra falar a verdade, nem sei ao certo afirmar entre os quatro quem realmente era o melhor; era um grupo que se completava. Mas não se pode negar: Mussum era ao menos o mais subversivo do grupo. Imagine um programa voltado para a família, com claro apelo junto ao público infantil, ter como um dos principais personagens um cara que era o típico estereótipo do malandro carioca, sambista, que vivia no bar, ou com uma garrafa de “mé” debaixo do braço. De fato, algo impensável nestes tempos em que impera a classificação indicativa na nossa televisão. Nos dias atuais, Os trapalhões seriam reclassificados, e só poderiam ser exibidos no horário do BBB, sei lá.


Mas voltando ao avião: lá estava ele, no fim do avião, já perto daqueles claustrofóbicos banheiros – quando eu era criança, tinha medo de fechar a porta e ficar preso lá dentro, mas ao mesmo tempo, tinha medo do escuro do banheiro, já que a luz só acendia com a porta fechada – de alguma forma entretido no livro que tinha em mãos. Ninguém no avião ousava interpelá-lo e, assim incomodar a sua leitura, por mais agitadas que as crianças do avião inteiro se mostrassem.


Foi então que, num momento de bravura único para a média daquele avião – e instigado por meus pais também, admito –, peguei um cartão postal que havia na poltrona onde estava, levantei-me e dirigi-me até o fim do avião, e não, não fui para o banheiro, mas, na verdade, ousei interromper a leitura que tanto o entretia, a fim de obter um autógrafo. Para meu espanto, apesar de extremamente solícito e educado para comigo, não houve nenhuma piada, comentário engraçadinho acerca daquele cara esquisito que estava duas poltronas à frente ou coisa parecida; limitou-se à educadamente me cumprimentar – algo do tipo “sai fora garoto, que eu tô lendo”, mas, como disse, bem educado – e assinar no verso do cartão.


Foi aí que eu me toquei, do alto dos meus oito anos de idade, que a vida é uma grande representação – talvez não tenha sido algo tão profundo assim; tá mais pra profundo tal qual um pires – e que as pessoas não são sempre as mesmas, ou, pelo menos, as mesmas a que nos acostumamos a ver na televisão. Mas isso não diminuiu minha admiração pelo artista que ele era, pelo contrário. Vi ali que o Mussum nada mais era do que um personagem; o bêbado, o sambista, o humorista, o cantor etc. Todos eram facetas de uma pessoa só, que era tudo e ao mesmo tempo nada daquilo.


Mas esse meu ímpeto em busca do autógrafo foi o que as demais crianças do avião precisavam para ir lá falar com ele, e acabar de vez com seu sossego. Mas até aquela noite – já mencionei que estava de noite? –, devo admitir que nunca tinha me sentido tão corajoso em toda a minha vida: sem hesitar, deixei o conforto da minha poltrona e a companhia protetora dos meus pais e irrompi o corredor do avião, falei com ele e pronto; fui devidamente recompensado, com um autógrafo que, em tempos de câmeras digitais e artistas efêmeros, pode não querer dizer muita coisa pra maioria das pessoas. Mas pra mim, foi muito mais que uma simples assinatura.



Aqui está o autógrafo, acompanhado do meu “autógrafo” do lado da data…

Sei que essa música, tirando seu intérprete, não tem nada a ver com o texto, mas é que é muito boa. Ouvindo Bacubufo no Caterefofo, dos Originais do Samba.

Um comentário:

  1. E não é que eu lembro desse vôo?! Mas, ao contrário da sua bravura, envergonhada, eu nem conseguia olhar pra poltrona dele. Vai entender o erê... bobeiras de criança

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